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terça-feira, 15 de maio de 2012

27. EXCESSOS LUTERANOS APÓS A DIETA DE AUGSBURGO



Lutero: “Não aceitamos Moisés; ele só é bom para os judeus. Não nos foi enviado por Deus” (Propôs de Table, n. 356). 


Os autores da película Lutero foram sábios em terminar o filme em Augsburg. É no final da vida que Lutero vai tornar a tarefa dos seus biógrafos cada vez mais complicada. Veja-se, por exemplo, o anti-semitismo do rebelde: no começo da revolta, Lutero sonhou com a conversão dos judeus para sua causa. A idéia era sedutora, pois a aceitação do Evangelho pelos judeus seria um selo de confirmação de sua missão divina. Como nada conseguiu, virou-se mais tarde contra eles violentamente: “... seu ódio do Judaísmo posteriormente induziu-o a lançar um ataque nunca visto contra eles.” (Grisar: 262) 



E voltou-se violentamente mesmo contra Moisés: “Quanto a Moisés, não pode ouvir falar dele. Moisés é para ele um inimigo pessoal, inimigo a seu modo. “Não aceitamos Moisés; ele só é bom para os judeus. Não nos foi enviado por Deus” (Propôs de table, n. 356). 





Lutero dirá ainda: “se te falam de Moisés para te constranger a aceitar-lhe os mandamentos, responde-lhes atrevidamente: - Vai falar de teu Moisés aos judeus! Não sou judeu, deixa-me em paz!” (Brentano: 151) 



Também, sem justificativa e virulento, tratava assim o Profeta que libertou o povo judeu da escravidão: “herege excomungado, precito, pior que o papa e o diabo” (sic!) (Franca, IRC: 258) 



Campos de Concentração e Extermínio de
Judeus não eram outra coisa senão reflexo
do ódio de Lutero contra eles
E seu ódio não conhecia limites nem meios. Mesmo nos sermões atacava com violência os judeus: “O grande reformador (sic) pronunciou seu último sermão, domingo, 14 de fevereiro de 1546, na igreja de Eisleben; ainda gritos de ódio e de proscrição, desta vez dirigidos contra os judeus, dos quais o orador reclama a expulsão dos domínios comunais. É verdade que, tendo sido atacado de nova opressão no peito, seguido de vertigens, Lutero estava convencido, como escreve a Catarina de Bora, de que os judeus da região, em conivência com o diabo, tinham feito desencadear um vento hibernal para gelar-lhe o cérebro. (sic)” (Brentano: 218)

Grisar relata o mesmo fato no sermão de 1546: “Soberanos (...) não deveis tolerar, mas expulsá-los.” (Grisar: 543; também em 569)

Nem a prática da usura – alegada queixa contra os judeus – poderia justificar tais palavras num libertador da humanidade.


...É por isso que o filme se encerra abruptamente em 1530... Mas há mais... Muito contra o pensamento comum atual, o tolerante Lutero manda expulsar os judeus - através do poder civil – e é o rei católico que os recebe: “Com a sanção de Lutero, John Frederick  expulsa os judeus do eleitorado da Saxônia em 1536, enquanto o Rei Fernando garante a eles asilo em seus territórios.” (Grisar: 542) 

Lutero escreveu ainda a Epístola contra os Sabatarianos em 1538, contra os judeus, que introduziram a prática de guardar o Sábado em algumas localidades. Escreveu em 1542: 

Dos Judeus e suas Mentiras

,que é parte de “(...) um violento ataque, destinado a aniquilar o hostil Povo Judeu”. Em seguida publicou O Shem Hamphoras e a Geração de Cristo, que “(...) transborda com ataques e é saturado com vulgaridades. Shem Hamphoras (ou “nome peculiar”), segundo Lutero, era uma fórmula cabalística dos judeus, supostamente sendo adornada de grande poder, por meio da qual Jesus alegou ter operado seus milagres.(sic)”. Em 1543, outro delírio: As últimas palavras de Davi: “Um ardente zelo pela Cristandade ofendida reflete-se nessas produções, as quais carregam a evidência de uma estrutura mental agitada.” (Grisar: 543) 

E por mais constrangedor que possa soar hoje, Lutero exaltava a Alemanha em expressões aterradoras: “Também o que prevalece em Lutero é a alma e o pensamento alemães. (...) alguns cidadãos da cidade (Metz), convertidos às novas doutrinas, quiseram entrar na liga de Smalkalde. O landgrave de Hesse opinava que era preciso admiti-los; mas Lutero opôs-se: “Ele não tinha confiança nesses cavalheiros de Metz que usavam nomes franceses e eram de origem francesa. (...) Para ele também, o povo alemão é o povo eleito; o povo alemão domina todos os outros – Deutschland über alles.“ "A Alemanha, diz ele, foi sempre o melhor país, a melhor nação.” (Propos de table, n. 904). (...) Seu Manifesto à nobreza cristã de nacionalidade alemã, escreve Lucien Febvre, “soa como um grito de união dos germânicos.” “Lembrai-vos de que sois germânicos!” não cessa ele de gritar aos seus queridos alemães. Ao que Hitler responderá em nossos dias como estrondoso eco. Às massas que o seguem, ele se dirige como novo profeta alemão. Em sua Admoestação aos seus queridos alemães (...): “Eu sou, diz-lhes, o profeta dos alemães. É para vós, alemães, que procuro a salvação, a santidade... Sou vosso Apóstolo.” (Propos de table, n. 678). 

Quer fundar uma Igreja alemã (Köstlin Kawerau, I, 552).” (Brentano:172-173) 


Talvez somente o monstro Hitler tenha conseguido equiparar-se ao monge rebelde, em se tratando de nacionalismo alemão exacerbado. Também é interessante notar que: “Hitler, que é católico (sic), mandou considerar festa nacional na Alemanha a data de 31 de outubro de 1517, quando o monge agostiniano revoltado afixou nas portas da igreja do castelo de Wittemberg as famosas noventa e cinco proposições (...)” (Brentano: 174)

É digno de menção também o notório ódio de Lutero ao povo. Algumas passagens já foram citadas anteriormente. Num momento em família, Lutero confidenciava: “Depois de sentar o filhinho nos joelhos: “Grande benção de Deus, dizia, contemplando o filho; esses brutos camponeses não são dignos disso, não lhes deviam nascer senão porcos.” (Propos de table, ns. 978 e 2454).” (Brentano: 131) E ainda:

“Quando um “traqueador” (furtz lecher) quer governar, só pode resultar mal; que os camponeses triturem seus queijos, tratem das vacas e cozinhem, eis sua tarefa. (Propos de table, n. 1606)” (Brentano: 131) 

Grisar descreve o fenômeno em termos mais abrangentes: “No início da guerra dos camponeses ele [Lutero] fala e escreve furiosamente contra os camponeses e a massa, e continua a fazê-lo até o final de sua vida. (...) Em seus discursos ele freqüentemente sustenta-se em um verdadeiro ódio contra a massa, chamando-a “mestre todos” (Master Omnes), “monstro de várias cabeças,” etc. Como disse um autor protestante, Feuchtwanger, não se separa Lutero facilmente das idéias político-sociais de Maquiavel, que aconselha soberanos a manter o laço curto com as massas.” (Grisar: 560) 

Daí não surpreende que Lutero chegasse a pedir o retorno da escravidão: “Gradualmente ele clama por autoridade absoluta. (...) “ Cristo não queria abolir a escravidão ,”diz [Lutero] em outra passagem sobre a condição oprimida dos camponeses, cuja sorte piorava constantemente. “O que importa a Ele como os senhores ou príncipes governam [nas coisas temporais]?” Em seus sermões sobre o primeiro livro de Moisés, ele de fato representa a servidão como um estado relativamente desejável. “Se a sociedade é para durar... será necessário restabelecê-la [a escravidão]” (Grisar: 560)

E, de fato, essa idéia é coerente com a doutrina exposta por Lutero em "A Liberdade do Cristão", onde ele advoga que o cristão é totalmente livre em seu interior, enquanto inteiramente servil para o mundo externo, na sociedade. (Grisar: 166) 

Com tantos ódios e rancores, não surpreende que Lutero fosse se tornando cada dia mais amargo e infeliz. Note-se, por exemplo, sua melancolia ao ver a Alemanha destruída por suas doutrinas: “Lutero se aproxima dos sessenta anos; seu humor tornou-se sombrio, estado de alma que sua correspondência reflete. Toda a alegria, a jovialidade, seu humor (...) desapareceram. (...) sobretudo sofre pelo estado e que se encontra o país, a Alemanha, a sociedade onde vive. Tinha ingenuamente (sic) imaginado que já que o mundo estava agora, graças a ele (...) de posse das verdades celestes (...) o mundo ia entrar numa era de felicidade, de concórdia, de ventura, de bondade, de fraternidade e de amor. Contrariamente: “A Alemanha acabou-se, escreve nesse ano de 1542, não será nunca mais o que foi outrora. Também, como estou cansado! Demos de ombro! Aconteça o que for possível!” “A igreja é espoliada, despojada,escreve mais longe (sic), não há mais caridade; mas rouba-se, pilha-se. Em tempos idos, reis e príncipes faziam dádivas generosas às igrejas, ajudavam-nas; atualmente eles as saqueiam ... Mesmo aqueles que se dizem evangélicos atraem para nós a cólera de Deus por sua rapina, pelos roubos sacrílegos.” (Brentano: 211-212) 

Esquecia Lutero que as rapinas e os príncipes avarentos eram o produto de sua pregação... E continua Brentano: “As abadias são atacadas, tomadas de assalto, saqueadas sob a melodia dos cânticos, à sombra dos estandartes onde se lê a divisa evangélica: “A palavra de Deus perdura”. Altares, quadros, órgãos e objetos do culto são quebrados, calcados aos pés, os cálices, ostensórios, ornamentos bordados a ouro, são roubados, as hóstias profanadas, os edifícios religiosos saqueados, a menos que eles não sejam convertidos em cavalariças.(...)” (Brentano: 212)

Desolado pela desgraça que provocou, Lutero escreve em 1544:

“Vejo em todo o mundo uma cupidez incompreensível, o que prova que o derradeiro dia está próximo. Parece que o mundo, em sua extrema velhice, cai em delírio como acontece aos moribundos.” E sobre Wittemberg, berço de sua revolta: “Falta de boa fé, malícia, na nobreza, na corte, no seio do magistrado; ao que se vem juntar na cidade e no campo o desprezo da palavra de Deus e uma negra ingratidão.” (Brentano: 213)



Nas palavras de Lutero, Wittemberg tornara-se uma “Sodoma (Brentano: 214) 

Depois da tempestade, Lutero só vislumbrava destruição, e não bonança: “O Evangelho hoje em dia encontra aderentes que se persuadem não ser ele senão uma doutrina que serve para encher o ventre e dar larga a todos os caprichos.” (Franca, IRC: 197)

E falando a Melanchthon “Com zelo e amor abraçam o Evangelho porque nele vêm um atalho para a licença que sacode todos os jugos.” (Franca, IRC: 197)

Lutero escreveu amavelmente ao Duque George da Saxônia em 1525, ainda com esperança de trazê-lo à sua causa. Em excelente resposta, o Duque nos dá uma idéia da ordem moral vigente em Wittemberg nessa época: “O Duque mostra que Lutero estabeleceu lá (Wittemberg) um asilo, uma fortaleza para apóstatas, incluindo aqueles pertencentes a seu território. Todos os monges e freiras “ que espoliam nossas igrejas e mosteiros,” ele diz, “encontram refúgio com você”. A aflição e miséria das freiras fugitivas é evidente. “Onde houve tantos monges e freiras fugitivas como agora em Wittemberg? Quando as esposas foram tiradas de seus maridos e dadas a outros, como agora é o caso, sob o seu evangelho? Quando o adultério foi mais comum do que quando você escreveu: quando uma esposa não pode tornar-se mãe por seu marido, ela deve ir a outro e engravidar, cujo filho o marido é obrigado a criar? Parece não ter havido resposta de Lutero... (Grisar: 288) 

Vimos também que a situação não era melhor em Erfurt  (Grisar: 306) 

E podemos acrescentar à lista Strasburgo, na confissão de Bucer: “Entre nós em Strasburgo mal há igrejas, não há reconhecimento da Palavra de Deus, nem freqüência aos Sacramentos.” (Grisar: 321) 

Enfim, em toda Alemanha luterana grassava a corrupção: “Em toda parte as congregações apresentam um quadro deplorável, dado que os camponeses nem aprendem, nem rezam, nem fazem qualquer coisa que não seja abusar de sua liberdade; eles nem confessam, nem comungam, como se estivessem completamente afastados da religião.” A situação foi constatada pelos observadores protestantes, que então darão o motivo esperado pelos príncipes para intervir definitivamente na religião, e impor a igreja nacional (Grisar: 331) 

Lutero, desiludido e cansado, vendo seu evangelho produzir só destruição e corrupção, foi tornando-se cada vez mais afastado da realidade. A profecia de Jeremias sobre Gog e Magog 
significava para ele a destruição da Alemanha pelos turcos, num delírio escatológico que se tornou recorrente. (Grisar: 381) 

O mesmo Melanchthon que no filme aparece jubiloso em Augsburg com o triunfo da reforma, parece ter aconselhado a mãe perto da morte a permanecer Católica: “A nova religião parece mais aceitável, mas a antiga é mais segura” 

Mesmo os protestantes admitem que essa frase não é improvável, embora não tenha sido demonstrada sua veracidade. (Grisar: 464) 

Se o fundador do protestantismo sofria as conseqüências do seu desastre, que dizer daqueles que o seguiam, e que propagaram suas doutrinas: “Melancolia pode ser quase considerada como a principal doença da época da Reforma” (Grisar: 467)

Entre os que sofreram desse mal, citam-se “Jerome Baumgartner de Nuremberg, Luke Osiander, e Zachary Rivander fala de pessoas saudáveis por toda parte sofrendo de medo, falta de consolação, e tensão mental; que o número de suicídios aumentou de modo assustador de maneira a deixar qualquer um de cabelo em pé; e que eles acreditavam ser isso um sinal anunciando a proximidade do fim do mundo(Grisar: 467) 

Ao ver os péssimos frutos da Reforma, mesmo luteranos convictos como Justus Jonas Spalatin sucumbiram à melancolia: “Em conseqüência de “tentações espirituais” (G. Kawerau) que sofreu depois das Guerras de Schmalkalde, Jonas desenvolveu uma desordem mental grave similar à morbus melancholicus de Spalatin. Diz-se que sua morte (1555) foi mais alegre que sua vida.” (Grisar: 467)

Podemos acrescentar à lista de melancólicos Jerome Weller, que Lutero aconselhava a pecar para combater a tentação (sic); Nicholas Hausmann, Simon MusaeusNicholas Selnecker (o editor dos Propos de Tables)Wolfgang Capito (o arauto de Strasburg) e Joachim Camerarius (amigo íntimo de Melanchthon). Todos sofreram da melancolia religiosa crônica. (Grisar: 467) 

Mathesius confessou que a visão de uma faca o instigava ao suicídio; George Besler de fato levou a tentação ao seu termo. (Grisar: 468) 

Uma literatura peculiar, com conselhos para combater a melancolia teve grande florescimento nessa época tenebrosa da humanidade (Grisar: 468) 

E o mais incrível: Lutero não acreditava em sua própria doutrina, como confessou em várias ocasiões! “Antonius Musa, pastor de Rochlitz, confidenciou a Lutero que estava deprimido porque não podia acreditar nas coisas que ensinara a outros. Daí Lutero respondeu conforme (o relato de) Mathesius: “Louvor e graças a Deus que isso também ocorra a outros. Eu pensei que isso só era verdadeiro no meu caso.” (Grisar: 468) 

Em vez de reconhecer a desgraça que havia produzido, Lutero dizia que tais comportamentos se deviam à fraqueza humana, que não estava preparada para receber a Palavra (sic!). E que aqueles acontecimentos sinalizavam o fim do mundo. Ele mesmo marcou o final dos tempos mais de uma vez (Grisar: 493) 

Já que a humanidade não podia compreender sua doutrina, então era melhor que Deus destruísse tudo! No final da vida Lutero se tornará amargo e verá o fim do mundo como única solução para o desastre de sua pregação. Hitler não pensará diferente, quando após ter entregado a mesma Alemanha aos algozes, culpará os alemães por não terem 
correspondido à sua missão divina, merecendo então ser castigados com a destruição total. Em carta a Amsdorf, falsamente sagrado “bispo” luterano, Lutero confessava: “Toda Alemanha (...) apresenta uma terrível cena de desmoralização e decadência”. E em outra ocasião, encontrando a solução para tão grande ruína: “É responsabilidade de Cristo ver isto (...) pois Ele mesmo por Sua Palavra chamou tanto mal e tão grande ódio por parte do demônio.” (Grisar: 535)

Ou seja: a culpa da destruição luterana era de Cristo! Ë bem difícil que tenha nascido blasfemador maior que Lutero! Por isso diz a Escritura sabiamente: “Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus.” (Mt 7,21) 

E se Lutero não era amigo do povo, também não pode ser chamado propriamente de libertador, como sugere continuamente o filme. Vários episódios mostram como a reforma foi imposta à força, pelos nobres, como na cidade de Eilenburg, já em 1522, a partir de sua idéia mestra: “É obrigação do soberano, como governador e irmão Cristão, expulsar os lobos e ser solícito para com o bem estar do seu povo.” (Grisar: 228) 

Como já foi citado, na primeira parte de "A Liberdade do Cristão"Lutero afirma que o Cristão, em virtude da fé é “senhor livre em todas as coisas e não sujeito a ninguém.” Na segunda parte do livro, afirma que “o Cristão é o servo em tudo e sujeito a todos.” (Grisar: 166) 

Não poucos autores protestantes criticaram essa obra, em vista de seu caráter milenarista (Grisar: 168) 

Contra os concorrentes, Lutero também dispensava o tradicional desprezo e orgulho. ValentineIckelsamerque disputou com Lutero, qualificou-o de novo papa, por causa da intolerância e da falta de critério com que produzia seus dogmas (Grisar: 255) 

Lutero soube cativar os príncipes fazendo-os espelharem-se nos patriarcas do Antigo Testamento, que guiavam todos os assuntos em seu território, fossem espirituais ou seculares. Lutero também apelava à consciência dos príncipes, para que trabalhassem diligentemente pela causa do evangelho, o dele, é claro. E curiosamente, após ter feito progredir a reforma em algumas cidades, intima os príncipes a acabarem com a diversidade de cultos, que poderiam criar problemas em seus domínios, levando à desordem e ao caos. Evidentemente o culto a ser mantido deveria ser o luterano: “Apenas um tipo de doutrina pode ser pregado em cada lugar”. O eleitor da Saxônia soube corresponder a seu apelo. (Grisar: 313) 


O novo evangelho usou mais que palavras para triunfar: “A poderosa intervenção do governo secular fornece a chave para solucionar o mistério do rápido progresso da Reforma.” (Grisar: 319)

Os mosteiros fiéis ao catolicismo que tentaram resistir foram arrasados pelos tiranos protestantes (Grisar:322) 

Filipe Hesse assumiu o governo religioso de seu território como um bispo supremo, apesar de sua conhecida falta de virtude. (Grisar: 328)

Em toda Alemanha os soberanos passavam a atuar como suprema autoridade religiosa, graças a Lutero. (Grisar: 329)

Com o domínio dos príncipes, a Igreja passou a ser questão do Estado, e para garantir o culto único, foram instituídos fiscais “visitadores”, que depois de visitar as paróquias reportavam às autoridades abusos e desvios da orientação luterana. Contra os hereges, particularmente os
anabatistas, Lutero aprovou a pena capital, em várias ocasiões. (Grisar: 332-333) 

Lutero asseverava que o poder civil deveria dar suporte à religião. Em carta a Spalatin em 1527, dizia que os fatos mostraram (...) que os homens desprezam o evangelho e
insistem em serem compelidos pela lei e pela espada.”  “(...) as massas devem ser “conduzidas e dirigidas para a fé.” (Grisar: 473)

Em Wittemberg“(...) aqueles que persistentemente negligenciaram o comparecimento ao sermão eram ameaçados com “banimento e a lei”. A corte de Wittemberg também ordenou o comparecimento universal à igreja.” (Grisar: 474) 

Lutero ameaçou com a excomunhão a um pecador público – VonMetzsch (Grisar: 474) 

Eis o campeão da liberdade! E por mais incrível que pareça, em seus sermões sobre S. Mateus, Lutero manifestava-se contra seu próprio livre-exameNão é permitido a ninguém excogitar suas próprias idéias, formular sua própria doutrina, permitir-se ser chamado Mestre e dominar ou censurar qualquer outra pessoa.” (Grisar: 501) 

Para dar aulas na universidade de Wittemberg, era preciso fazer um juramento! - “Ordination Oath” – precedido por um exame teológico. Lutero e outros assinaram a ordenação de um tal
Heinrich Bock, onde se lê que ele tinha garantido “pregar firme e fielmente a pura doutrina do evangelho confessada por nossa Igreja.” (sic!) (Grisar: 501-502) 

Melanchthon aprendeu bem a lição do mestre, e asseverava que “liberdade de crença” era “negada a cada item”Também elogiou a execução de muitos hereges, como Miguel Servet sob Calvino. E também desejava ver a morte de Henrique VIII, por um “assassino corajoso” enviado por Deus. (Grisar: 503) 

Quanto ao uso do poder civil, confessou Melanchthon: “Se a autoridade civil não interviesse, o que seria de nossas prescrições? – leis platônicas.” (Brentano: 161)

Liberdade? Apenas o tempo suficiente para usurpar a autoridade da Igreja Católica... Como Lutero não conseguiu atrair as multidões pela pregação da Palavra e nem afastar os papistas, como supunha: “Enganei-me miseravelmente, dirá depois; tive a dolorosa experiência (junho-julho de 1532, Propos de table, no. 1682)”, foi obrigado a apelar ao poder civil para ver triunfar sua religião, como bem se nota na restrição da pregação ao seus seguidores no eleitorado da Saxônia“Batei-lhes como blasfemos! grita agora, é vosso dever entregá-los a mestre Hans (M. João, sobrenome do carrasco). Nos burgos o magistrado local deve evitar que os pregadores comentem o Evangelho senão conforme a verdadeira doutrina (sic.), e não pelas interpretações à maneira romana, como se tem tolerado até aqui.” (Brentano: 161-162) 

E também, quando consultado sobre a Missa Católica, no resumo de Brentano: “Em toda a extensão do império a missa horrível deve ser suprimidanão serão tolerados mais senão sacramentos conforme as idéias de Cristo, isto é, em harmonia com as idéias de Martim Lutero; as universidades e escolas devem ser reformadas no sentido evangélico; todos os bispados serão secularizados e transformados em organizações leigas.” (Brentano: 162). 

Evidentemente Lutero só pregava a liberdade fora dos territórios da reforma: “O que torna tudo isso particularmente picante é que na mesma época em que Lutero dava ao eleitor de Saxe os conselhos que acabamos de ler (restrição ao culto), dirigia-se ao duque Georges de Saxe, que permanecera fiel ao catolicismo, para suplicar-lhe que deixasse pregar e praticar livremente em seus Estados a religião protestante; (...)” (Brentano, 162) 

E falando em tirania, quando Henrique VIII assassinou os dois homens que se opuseram a seu cisma – São Tomás Morus São João Fischer – foi aplaudido pelos libertadores de Wittemberg. Lutero: “É permitido entregar-se à cólera quando se sabe que traidores, ladrões, assassinos são os papas, seus cardeais e seus legados. Praza a Deus que vários reis da Inglaterra se empenhem em fazê-los desaparecer.” Melanchthon, o pacífico humanista: “Deixar cair a espada na cabeça dos ímpios, é obedecer à lei de Deus.” (Brentano: 162; também Grisar: 415) 

Os santos mártires Morus Fischer se opuseram ao escandaloso divórcio e re-casamento do rei, que arrastou a Inglaterra à desgraça. Seu sangue é precioso aos olhos de Deus: “Pretiosa in conspectu Domini mors sanctorum eius” (Salmo 115) 

E os relatos da tirania luterana não têm fim: “Naturalmente o papa de Wittemberg restabeleceu a excomunhão. Proceder-se-á contra o ímpio, publicamente, diante da comunidade. Quanto aos obstinados, diz Lutero, “que vão para o diabo”. Depois de mortos serão jogados no monturo. Os despojos daquele que se abstiver da comunhão serão tratados como os de um cão. A força das leis deve sustentar a Igreja, pois os homens menosprezam naturalmente o Evangelho. Por essa palavra, usada geralmente, Lutero denomina sua própria doutrina. O ser humano gosta de ser constrangido à verdade pelo gládio. Aqueles mesmos que não tem fé devem ser obrigados a assistir aos sermões. Monges, curas e todos os tonsurados devem ser degolados.

“Eu mesmo me ocuparei da missão; bando de patifes, que não são bons senão para desaparecer.” (Brentano: 162-163)

Citemos ainda, sobre a censura e a perseguição aos dissidentes: “Na Universidade de Wittemberg, os mestres, os doutores, ensinarão a doutrina luterana revelada por Deus, e os tribunais lhes prestarão concurso. Lutero escreve aos burgueses de Meissen que se desviaram de seu ensinamento, para que façam o quanto antes confissão pública (...) Não suportava (Lutero) sequer que juristas e membros da faculdade de Direito (...) exprimissem livremente opinião sobre questões de ordem relativamentesecundária (...) Lutero chegou a instituir “visitadores” (...) inquisidores que penetravam nas famílias afim de se informar se tudo se passava conforme suas prescrições .” (Brentano, 163) 

E a tolerância religiosa, tão ventilada entre os reformados“Numa carta ao duque Alberto da Prússia (...) Lutero se espanta de que a doutrina zwingliana seja ainda tolerada em seus Estados. Contra os sacramentários de Zwingli, os de Munzer, de Carlstadt, contra os antinomistas, os anabatistas e tantos outros independentes oriundos de sua propaganda, o pontífice de Wittemberg não cessa de se dirigir à autoridade secular (...) em apelos urgentes para que tais “hereges” sejam impedidos de espalhar suas idéias e fazer-lhes propaganda.” (Brentano, 163) 

Na mesma linha, contra a pregação aberta e contra o livre-exame inventado por ele: “Lutero obrigou o eleitor de Saxe a construir uma prisão especialmente destinada aos pastores e pregadores, cuja conduta ou palestras fossem por ele julgadas dignas de censuras. Ele próprio fala de um certo João Sturm “que se obstinara em crer que Cristo não morrera senão para exemplo.”  "Foi conduzido a Schwrinitz e encarcerado na torre, onde morreu .” (Brentano: 164)

E Lutero também tinha sua inquisição“Em fins de 1529, em Reinhardsbrunn, seis “hereges” por acusação luterana foram entregues a esse M. Hans a quem o reformador formulava tão rude apelo. Suas cabeças tombaram em 18 de janeiro de 1530.” (Brentano: 164) 

É claro que as queixas começaram a surgir. Os anabatistas exclamavam: “há dois falsos profetas, o Papa e Lutero, mas dos dois Lutero é o pior” (Grisar: 417) 

E mesmo Melanchthon – o fiel secretário! – fazia coro às queixas contra Lutero, em carta a Camerário: “Vivo na escravidão, como no antro de Ciclope.” (Bossuet: T. 1, L. V, 254) Lutero se voltou contra seus próprios aliados. E sua doutrina diabólica se voltou mesmo contra ele próprio. Essa situação é já antecipada pelo salmista: "Eis que o mau está em dores de parto, concebe a malícia e dá à luz a mentira. Abre um fosso profundo, mas cai no abismo por ele mesmo cavado. Sua malícia recairá em sua própria cabeça, e sua violência se voltará contra a sua fronte." (Salmo VII, 15-17)

Lutero odiava a razão, porque ele era um gnóstico. Em seu último sermão em Wittemberg, não cessa de maldizê-la: “A razão é a prostituta, sustentáculo do diabo, uma prostituta perversa, má, roída de sarna e de lepra, feia de rosto (sic), joguemos-lhe imundícies na face para torná-la mais feia ainda.” (Brentano: 217) 

Como Melanchthon insistia em querer sistematizar a doutrina luterana e colocá-la em bases aristotélicas, Lutero mostra também todo seu ódio e desprezo pela filosofia: “Eu devo cortar a cabeça da filosofia, e que Deus me ajude a fazê-lo; pois assim deve ser.” (Grisar: 462) 

Lutero também se mostrou contra a ciência: “Lutero manifestou-se, várias vezes, sobre a concepção que formulara do mundo. Ela é justa e concreta. A terra é seu centro (...) Acima da Terra, uma abóboda imensa (...) a abóboda azul (...) é firme, sólida; e por cima, se estende o céu. O inferno fica no centro da terra, sob nossos pés (sic.). O abade Copérnico surgiu, pretendendo que a terra girasse em torno do Sol. Lutero deu de ombros. Lê-se na Bíblia que Josué deteve o Sol; não foi a Terra que ele deteve. Copérnico é um tolo" (Brentano: 145)

Mostrar Lutero tal qual era em sua época pode ser um choque para muitos. Mas é a única maneira honesta de mostrá-lo, e – com relação ao filme – desmascará-lo. Como dizia São Francisco de Sales, retomando São Jerônimo: "Reduzir a heresia à sua origem é refutá-la(São Jerônimo, Ad. Lucif. 28; apud Sales: 207).


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